O presente trabalho pretende discutir a centralidade do conceito de rede na contemporaneidade, com a intenção de identificar sob quais formas se apresenta em sua relação com as políticas sociais de caráter pluralista, em vigor no Brasil principalmente após a década de 1990. Tais políticas estabelecem as redes de apoio social como suportes privilegiados de provisão social ou então sugerem que sua atuação pode se dar nos mesmos termos nos quais operam o mercado e o Estado, utilizando como recurso a solidariedade. Para tanto, realizou-se uma revisão de literatura histórica sobre o tema, destacando o fato de que, ainda que a emergência contemporânea do conceito de rede tenha recebido significativa influência do informacionalismo que configura redes de comunicação em escalas internacionais, o interesse relacionado à proteção social fundamenta-se na reestruturação produtiva do capitalismo representada pela acumulação flexível, para a qual o conceito de rede surge como alternativa compatível e funcional, descentralizando os cuidados e a proteção social, que ficam desse modo sob a responsabilidade das benesses da sociedade civil, compreendida como sujeito histórico e não uma arena de lutas e de dissenso. Sob o ponto de vista ideológico, tal deslocamento apoia-se no ideário pós-moderno e na chamada racionalidade reticular, que apresentam como características a crença na inconstância, na efemeridade dos processos sociais e históricos, na incessante mudança. No entanto, o funcionamento social em rede não é algo novo e poderia até ser considerado regressivo quando vinculado à proteção social, na medida em que afasta os sujeitos históricos das conquistas relacionadas aos direitos sociais dos dois últimos séculos. No Brasil, especificamente, a proteção social nunca chegou a ser realmente uma preocupação governamental, situação que configura um cenário propício para o desenvolvimento de correntes teórico-ideológicas que têm no conceito de rede sua referência prima de proteção social. Contudo, as redes de apoio social refletem, para aquém da centralidade contemporânea, fundamentos socioantropológicos definidos, dentre os quais o ciclo dar, receber, retribuir, que estabelece o funcionamento primário da sociabilidade humana com base na dádiva. A fim de localizar de maneira concreta esses fundamentos, realizou-se pesquisa de campo em um região urbana periférica, associando cuidados em saúde com a percepção do direito social à saúde pela população. Considerando a impossibilidade de retorno às sociedades comunais e a complexidade das sociedades contemporâneas, propõe-se o deslocamento da dádiva para as vivências e processos democráticos, ainda que a plenitude destes somente possa ser alcançada com a supressão das desigualdades artificiais e socialmente impostas pelo capitalismo. Repolitizar as relações da sociedade com o Estado transformou-se no desafio contemporâneo para a manutenção e ampliação de direitos sociais como a saúde, sem os quais não se pode esperar uma vida humana digna na atualidade.